segunda-feira, 14 de abril de 2014

Calça curta.

Acho graça de mim cada vez que tu chegas. Se tu olhas, eu desvio, quase entro no freezer cheio de Coca-Cola; encontro qualquer coisa pra tentar empalidecer meu rosto novamente e dissolver o constrangimento rubro que me pinta. Quando tu te distrais, eu te recorto inteiro, e embaço o fundo pra te ver melhor. Quando percebo, já to rindo sozinha do teu cabelo desajeitado, e dos teus pés que andam em direções opostas. Também acho graça da maneira que tu falas, confesso. Mas eu sempre ignoro; ignoro porque não ouço mais a forma quando ela se faz em conteúdo educado e simpático... E lá vou eu te colocar de novo no meu sorriso idiota. A tua pele também já foi alvo da minha admiração. Ela fica rosa quando é frio demais, ou quando é calor demais. Mas quando abraçou teu colega, eu nem reparei de que cor tu ficaste, eu só vi o abraço. Se eu pudesse, te diria pra não usar mais aquela camisa verde. Eu a notei logo de cara, mas ela sumiu quando você foi gentil com aquelas pessoas que estavam ao teu redor, e quando tu, sem saber, me deixaste passar na tua frente na fila da lanchonete. A verdade é que eu te admiro antes de te amar e isso sim é um terreno perigoso. De amor eu dou conta, engulo, mastigo... Mas admiração me pega de calça curta. Por favor, não seja mais tão legal. Se puder, peça pra alguém falar mal de você pra mim, quem sabe assim deixo de calcular teus horários pra te encontrar.  Sorria menos também, tá? Não me cumprimente mais mesmo sem me conhecer. É cansativo pra mim. Sinto um pouco de raiva de ti por isso. Mas de raiva eu dou conta, engulo, mastigo... a admiração é que me pega de calça curta. 

domingo, 6 de abril de 2014

Dos nossos excessos.

                     Falei mil vezes sobre as nossas diferenças querendo encaixar um pouco de curiosidade na gente. Fracassei. A verdade é que precisei, enfim, reconhecer o acordo tácito que fizemos, desde o começo, sobre as semelhanças inúteis que temos. Nunca poderemos firmar um tratado de completude, de somar com aquilo que tens demais, para aquilo que me falta. Tudo que me sobra, esparrama de ti também. Aí a gente fica com mãos sujas da gente mesmo, e corre, um do outro, porque não tem nada a acrescentar. Tudo que eu poderia te dar, tu faz doação em campanha, porque já não tem onde guardar. Tudo que tu terias pra presentear a minha vida, eu deixo apodrecer em sacolas na despensa de casa, numa oferta que sobrepõe a procura e barateia nossa permanência na vida um do outro. Talvez por isso tua ausência me soe tão presente, ela sim faz sentido. Somente quando não estamos juntos tu me acrescentas alguma coisa. A saudade que sinto me faz melhor e oferece a única coisa que não tenho de ti: tu mesmo. Quando tu estás, eu me farto de tanto nós. Encho das nossas sandices e saio cansada como um moleque ao fim de um dia de praia. Quando tu não estás é que finalmente tu te apresentas na minha vida de maneira mais cheia de paz. Quando tu não estás eu não preciso te entender, nem me cansar, nem transbordar. Quando tu não estás eu tenho o melhor de nós. Eu gosto de perceber tua ausência, é a maneira que o mundo encontrou de nos deixar juntos sem causar danos, já que de outra forma a gente explodiria por excesso. Por excesso de dor. Por excesso de alegria.